Abaixo transcrevemos notícia de um julgamento de recurso proferido pelo STJ – Superior Tribunal de Justiça, sobre serviços odontológicos relacionados à ortodontia e a obrigação de resultado. Na linha do que já vinha decidindo o E. Tribunal sobre a responsabilidade dos cirurgiões da área de cirurgia plástica embelezadora, mesma solução foi empregada aos ortodontistas. Embora a questão tenha sido dirimida em uma situação específica, ou seja, referida decisão não afetará a categoria dos ortodontistas de imediato, certo é que os futuros casos que se relacionem com o tema tenham o mesmo tipo de solução.
Assim, aconselhamos que os profissionais liberais da área da saúde de maneira geral, e aqui não estamos voltados apenas aos ortodontistas ou médicos do ramo da cirurgia plástica embelezadora, que pautem seus trabalhos com orientações aos clientes/pacientes por escrito, com anuência expressa destes em questões que dependam de modificação de hábitos de costume ou cuidados especiais pré, pós, ou durante o tratamento que se pretenderá executar.
Não podemos garantir que um contrato, termo de consentimento ou anuência ás recomendações proferidas pelos profissionais possam isentá-los de questionamentos judiciais, porém acreditamos que isto figurará como início de prova de boa conduta, a qual somente somará á defesa destes.
No julgado abaixo o ônus de provar que houve falta de cuidados pelo paciente foi transferido para o profissional, face á obrigação de resultado, que não conseguiu se desincumbir e acabou condenado.
Recomendamos, assim, que os profissionais liberais da saúde, principalmente os que desenvolvem atividades consideradas de resultado, façam uma revisão na parte de contratos, manual de recomendações e outros documentos que são ou deveriam ser entregues a seus pacientes, com anuência expressa destes. Um advogado que atue no ramo do direito civil, em especial na parte contratual, será uma ferramenta útil para agregar conceitos e formas de proceder.
STJ – Superior Tribunal de Justiça:
A responsabilidade do ortodontista em tratamento de paciente que busca um fim estético-funcional é obrigação de resultado, a qual, se descumprida, gera o dever de indenizar pelo mau serviço prestado. A decisão é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Um profissional do Mato Grosso do Sul não conseguiu reverter a condenação ao pagamento de cerca de R$ 20 mil como indenização pelo não cumprimento eficiente de tratamento ortodôntico.
A ação foi ajuizada por uma paciente que alegou fracasso de procedimentos realizados para correção do desalinhamento de sua arcada dentária e mordida cruzada. Na ação, a paciente pediu o ressarcimento de valores com a alegação de que foi submetida a tratamento inadequado, além de indenização por dano moral. A extração de dois dentes sadios teria lhe causado perda óssea.
Já o ortodontista não negou que o tratamento não havia conseguido bons resultados. Contudo, sustentou que não poderia ser responsabilizado pela falta de cuidados da própria paciente, que, segundo ele, não comparecia às consultas de manutenção, além de ter procurado outros profissionais sem necessidade.
O ortodontista argumentava, ainda, que os problemas decorrentes da extração dos dois dentes – necessária para a colocação do aparelho – foram causados exclusivamente pela paciente, pois ela não teria seguido as instruções que lhe foram passadas. Para ele, a obrigação dos ortodontistas seria “de meio” e não “de resultado”, pois não depende somente desses profissionais a eficiência dos tratamentos ortodônticos.
Em primeira instância, o profissional foi condenado a pagar à paciente as seguintes quantias: R$ 800, como indenização por danos materiais, relativa ao valor que ela pagou pelo aparelho ortodôntico; R$ 1.830, referentes às mensalidades do tratamento dentário; R$ 9.450, valor necessário para custear os implantes, próteses e tratamento reparador a que ela deverá submeter-se; R$ 8.750, como indenização por danos morais.
Obrigação de resultado.
O relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, afirmou que, na maioria das vezes, as obrigações contratuais dos profissionais liberais são consideradas como de meio, sendo suficiente atuar com diligência e técnica para satisfazer o contrato; seu objeto é um resultado possível. Mas há hipóteses em que é necessário atingir resultados que podem ser previstos para considerar cumprido o contrato, como é o caso das cirurgias plásticas embelezadoras.
Seguindo posição do relator, a Quarta Turma entendeu que a responsabilidade dos ortodontistas, a par de ser contratual como a dos médicos, é uma obrigação de resultado, a qual, se descumprida, acarreta o dever de indenizar pelo prejuízo eventualmente causado. Sendo assim, uma vez que a paciente demonstrou não ter sido atingida a meta pactuada, há presunção de culpa do profissional, com a consequente inversão do ônus da prova.
Os ministros consideraram que, por ser obrigação de resultado, cabe ao profissional provar que não agiu com negligência, imprudência ou imperícia ou, ainda, que o insucesso do tratamento ocorreu por culpa exclusiva da paciente.
O ministro Salomão destacou que, mesmo que se tratasse de obrigação de meio no caso em análise, o réu teria “faltado com o dever de cuidado e de emprego da técnica adequada”, impondo igualmente a sua responsabilidade.
O tratamento tinha por objetivo a obtenção de oclusão ideal, tanto do ponto de vista estético como funcional. A obrigação de resultado comporta indenização por dano material e moral sempre que o trabalho for deficiente, ou quando acarretar processo demasiado doloroso e desnecessário ao paciente, por falta de aptidão ou capacidade profissional. De acordo com o artigo 14, parágrafo 4º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e artigo 186 do Código Civil, está presente a responsabilidade quando o profissional atua com dolo ou culpa.
A decisão da Quarta Turma, ao negar pretensão do ortodontista, foi unânime.
REsp 1238746
* Luiz Claudio de Toledo Picchi – Picchi e Figueira Advogados
Últimos comentários